Em meio a um mundo marcado por tensões crescentes entre superpotências, o deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil-SP) deu um passo polêmico ao protocolar, na terça-feira (7 de outubro de 2025), uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que abre as portas para o Brasil desenvolver armas nucleares. A iniciativa, batizada informalmente de “PEC da Bomba Nuclear”, desafia décadas de compromisso brasileiro com o desarmamento atômico e reacende debates sobre soberania nacional em um cenário de instabilidade global. Kataguiri, conhecido por suas posições liberais e críticas ao establishment, argumenta que o país precisa de ferramentas de dissuasão para proteger seu vasto território e recursos estratégicos, como as reservas de urânio.

Legenda: O deputado Kim Kataguiri durante entrevista sobre a PEC, defendendo a necessidade de autonomia nuclear para a defesa brasileira. (Fonte: CNN Brasil)
A proposta altera diretamente o artigo 21 da Constituição Federal de 1988, que hoje restringe toda atividade nuclear em território nacional a “fins pacíficos” e sob aprovação do Congresso. Com a PEC, essa limitação seria removida, autorizando o desenvolvimento de armamentos atômicos exclusivamente para fins dissuasórios – ou seja, para desencorajar agressões externas. O texto prevê que as Forças Armadas, sob autorização expressa do presidente da República, conduzam pesquisas, testes e produção, vedando qualquer uso ofensivo ou fora de contextos de guerra. O emprego de bombas nucleares só seria permitido em casos extremos, como grave ameaça de invasão territorial ou retaliação a ataques com armas de destruição em massa. Além disso, a PEC obriga o Brasil a renunciar a tratados internacionais chave, como o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP) e o Tratado de Tlatelolco, que proíbe armas nucleares na América Latina. Para avançar, a emenda precisa de pelo menos 171 assinaturas de deputados – um desafio que Kataguiri já começou a enfrentar nos corredores da Câmara.

Legenda: Mapa global mostrando países signatários do TNP (em verde), não signatários (amarelo) e possuidores reconhecidos de armas nucleares (roxo), destacando o compromisso histórico do Brasil com o desarmamento. (Fonte: Wikimedia Commons)
A justificativa de Kataguiri ecoa preocupações com a “reconfiguração geopolítica” atual: rivalidades entre EUA e China, expansão da OTAN, avanços nucleares de Coreia do Norte e Irã. “A proposta não defende o belicismo, mas a preservação da paz por meio da força. Um país que não pode se defender não é verdadeiramente livre”, escreveu o deputado na exposição de motivos. Ele enfatiza que o Brasil, com sua tecnologia avançada em enriquecimento de urânio e posição estratégica, poderia impulsionar a Base Industrial de Defesa e a pesquisa científica, tudo regulado por uma lei complementar sob supervisão congressional. O contexto recente reforça essa narrativa: em setembro de 2025, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, gerou controvérsia ao afirmar, durante uma posse no Rio de Janeiro, que o país “vai precisar da nuclear também para a defesa nacional, garantindo a nossa soberania”. Horas depois, o Ministério recuou em nota oficial, reafirmando o uso pacífico da energia atômica e o cumprimento integral dos tratados internacionais, descrevendo Silveira como “jurista e pacifista”.

Legenda: Vista do plenário da Câmara dos Deputados, onde a PEC de Kataguiri busca apoio para tramitar e alterar a Constituição. (Fonte: CNN Brasil)
Essa PEC chega em um momento delicado para a diplomacia brasileira, que historicamente se posiciona como voz pela não proliferação – o país é signatário do TNP desde 1998 e líder na criação de zonas livres de armas nucleares na América Latina. Analistas apontam que a aprovação poderia isolar o Brasil internacionalmente, afetando parcerias comerciais e credibilidade na ONU, mas também elevaria seu status em negociações globais, à la Índia ou Paquistão. Até o momento, reações de outros parlamentares ou do governo federal são escassas, limitando-se à coleta inicial de assinaturas por Kataguiri. Críticos, ainda não formalizados, veem na proposta um risco de escalada armamentista regional, enquanto defensores a encaram como ato de “fé na paz, na ciência e na independência do Brasil”.

Legenda: Imagem icônica de teste nuclear, ilustrando os perigos da proliferação que a PEC de Kataguiri busca equilibrar com dissuasão. (Fonte: Politize! / Arquivo histórico)
As implicações dessa iniciativa vão além do Congresso: uma eventual aprovação demandaria debates éticos, econômicos e ambientais, questionando se o “paz armada” defendido por Kataguiri fortalece ou fragiliza uma nação pacifista por tradição. Enquanto a coleta de apoios prossegue, o Brasil se vê no centro de uma reflexão profunda sobre seu papel no mundo – entre a vulnerabilidade de um gigante desarmado e os fantasmas de uma era nuclear.